Cido Barbosa
– jornalista
Se alguém disser que o
Porto de Santos ou o Pólo Industrial de Cubatão podem explodir a qualquer
momento e que a região é uma bomba relógio, logo será tachado de ignorante, ou
fanático apocalíptico: alguém insano, sem conhecimento para sustentar suas
colocações. Afinal, temos dezenas de especialistas capazes de antever qualquer
risco trágico na região, não é mesmo?
Por outro lado, parece
ainda mais insano, qualquer comunidade se acostumar a viver com vazamentos de gases
tóxicos, explosões de tanques e incêndios gerando nuvens tóxicas sobre suas
casas. Quem em sã consciência pode viver nesta realidade? Mas é exatamente o
que está acontecendo conosco, moradores do eixo Cubatão, Santos, Guarujá, São
Vicente; numa região de quase 1 milhão de pessoas, considerada entre as
importantes do País.
É fato. Episódios que não
poderiam acontecer se repetem de forma inaceitável, diante da inércia de todos
nós.
Orgulhosos dos nossos
avanços, deixamos no passado o título de Vale da Morte do Pólo de Cubatão. Bem
como a lembrança da recente madrugada de sábado, 25 de fevereiro de 1984, que
revelou nossa fragilidade: a tragédia da Vila Socó, quando milhares de litros
de gasolina, de um vazamento numa das tubulações da RPBC transformaram a Vila
num imenso mar de chamas, dizimando centenas de vidas.
E parece que a
incredulidade, ou omissão se consolidam em detrimento da prevenção. Bem assim
foi 9 de janeiro de 1967 quando foi para os ares o gasômetro da cidade de
Santos.
Mas estamos conscientes dos
avanços. Tão seguros que uma explosão aqui e outra acolá, não nos abalam, mesmo
que insista em revelar a ineficiência da nossa defesa, a irresponsabilidade dos
produtores ou o sucateamento dos equipamentos de alta periculosidade instalados
há décadas na região. Sinceramente! Não consigo entender o que se passa no
nosso ‘consciente coletivo’.
Ontem conversei com uma
sobrevivente da Vila Socó. Imagine o que se passa na cabeça desta mulher ao ver
as costumeiras cortinas de fumaça. Para ela; tudo vai explodir a qualquer
momento: será neurose? Todo mundo acha que ela está traumatizada.
Penso que está na hora de,
ao menos, desconfiar e rever o nosso conceito de segurança. Vamos começar
questionar sobre quais parâmetros nos levaram a desacreditar em papai Noel e
acreditar na segurança que o ‘produtores da região’, nos asseguram. Não sei o
que é mais irracional?
Ontem ‘a água indevidamente
se encontrou com o produto químico’, gerando uma reação química. Há menos de um
ano, passamos oito dias sob tensão, com o incêndio da Alemoa, sabendo que por
perto existiam tanques químicos que poderiam causar danos trágicos e
irreversíveis. O saldo: danos ambientais e à saúde; mas a vida continuou, já
estávamos até esquecendo o assunto, nesta correria do dia a dia. Em menos de um
ano, dois vazamentos tóxicos em Cubatão; felizmente possíveis de ‘serem
abafados’.
Ou a sociedade se organiza
para cobrar e enfrentar este problema em sua real amplitude, ou continuaremos
inertes aguardando a próxima tragédia que, considerando a média dos últimos
acontecimentos, pode não demorar muito a se repetir.
Éd
Alemão
As perguntas que seguem sem
respostas precisas por parte das autoridades:
1 - Quais produtos químicos
queimaram ou estavam próximos ao local do fogo, além do composto de cloro?
2- Quais os danos que o
ácido dicloro causa ao meio ambiente?
3 – A Cetesb avalia alguma
irregularidade no armazenamento?
4 – Por que os
trabalhadores dos terminais não ganham insalubridade?
Não são poucos os casos de
moradores que, mesmo em casa, sofreram com o cheiro forte que provoca irritação
nos olhos, garganta e nariz. De acordo com as
prefeituras, 75 pessoas foram atendidas em Guarujá, 26 em Santos e 17 em
Cubatão.
Um levantamento da Codesp –
mapeou o que cada uma das instalações do cais santista movimenta. Com exceção
do Terminal de Passageiros Giusfredo Santini (Concais), as demais empresas
podem trabalhar com algum tipo de material nocivo aos moradores e ao ambiente.
Este ácido costuma ser
utilizado em desinfetantes e no tratamento de águas de abastecimento público e
industrial. A exposição ao gás tóxico pode causar queimaduras na pele, olhos e
aparelho respiratório, inclusive com danos permanentes aos olhos.
Dica
de filme
SPOTLIGHT – Segredos Revelados
Drama. Baseado em uma
história real, o drama mostra um grupo de jornalistas em Boston que reúne
milhares de documentos capazes de provar diversos casos de abuso de crianças,
causados por padres católicos. Roxy Pátio Iporanga (14:45hs e 21:30hs).