“Só queria viver em paz” – SENSITIVISTA.
Dom Quixote em 1989
morava no bairro Leopoldina, em São Paulo, com 3 amigos da pensão da Dª Célia
que se uniram para alugar uma casa. Ele tinha se livrado das garras do
Imperador, estava num novo emprego – Giannini Violões. Gostava de jogar uma
bolinha, pois sempre foi sua diversão, nas quadras de society no Ceasa. Ia às
piscinas do Pelezão (clube do Pelé) e no SESI da Leopoldina. Quando menino
queria uma piscina só para ele, pois era a maior dificuldade pular o muro das
mansões para tomar banho escondido. Pensava em fazer uma faculdade. Fim de
semana curtia os bailinhos, e sempre pegava uma gatinha. O Índio, Luizinho e o
Gilvan eram mais que amigos, verdadeiros irmãos. Parecia que a vida, de agora em
diante, sopraria bons ventos. Mas a infelicidade chegou em forma de um
telefonema. Joana D’Arc ligou. Ele ficou surpreso, pois nunca tiveram
intimidades apesar de conhecê-la. Ela dizia:
- Oi Edí! Não sei
se você está lembrado de mim? Você trabalhou pro meu pai, né? É que eu estou
precisando de uma ajuda.
- Mas! Joana, você
não está em Santa Catarina?
- Não, eu estou na
Vera. Passa aqui pra gente conversar.
Hoje, Dom Quixote
pensa: “nestas horas não deveria existir telefone. A minha amiga Vera tinha-lhe
passado o meu número.”
Joana estava de
volta. Contou que tinha acabado de fazer um aborto, que os ex-colegas da
faculdade ajudaram a pagar. Ela estava morando com a Vera e precisava de alguém
pra buscar o seu fusca na casa da ex-sogra em Itapevi (não tenho certeza do
lugar). Um lugar terrível, sem nenhuma infra-estrutura, nem descarga no
banheiro tinha; só muito barro e poeira. Dom Quixote ficou atônito. Como uma
moça que considerava princesa, pelo luxo onde morava, se encontrava numa
situação tão deplorável como aquela?
A vida de Dom
Quixote mudou da água pro vinho, parecia sina ou praga de mãe mesmo. A Vera
acabou expulsando Joana D’Arc do apartamento por ela não aceitar ir contra o
pai num processo judicial. A Vera ficou tão revoltada que não queria que ela
pegasse nem suas próprias roupas. Até a fechadura do apartamento trocou. Foi
preciso o Dom Quixote interceder e dar uma bronca na Vera para resolver a
situação. Ele teve que levar Joana D’Arc para sua casa. Como o Gilvan e o Índio
estavam para sair, e o Luizinho se casou, não seria tão incomodo; pelo menos
provisoriamente.
Os dias se
passaram, e algo que era para ser provisório, acabou se tornando permanente.
Dom Quixote era inexperiente com mulheres, e além do mais, muito carente devido
aos maus-tratos de sua infância. Com o decorrer dos anos vieram as filhas, e o
Imperador nunca se manifestou em conhecer estas netas. Joana sofria com a
indiferença do pai. Dom Quixote falava para Joana esquecê-lo, pois o mesmo
tentou lhe matar, lhe prender e lhe humilhar. E, o mais estranho, ela desejava
a morte do pai todo ano que se passava, falava assim: este ano ele vai morrer.
Dom Quixote pedia pra ela esquecer isto, esquecer o passado, esquecer este pai
filho da puta.
Dom Quixote lutou
feito um gigante para tentar dar o máximo de conforto possível para aquela
criatura, tão passível de pena e compaixão. Ela fazia lembrar-lhe dos seus anos
malditos de infância, quando se tem pai problemático e violento. Ele sofreu
muitos maus-tratos e agressões. Na escola era ridicularizado por ser retraído e
assustado. Traumas que um desgraçado que não tinha condições psicológicas para
ser pai, conseguiu destruir sua auto-estima.
Joana não esquecia
sua filha abortada, não esquecia (quem sabe) o seu primeiro amor, não esquecia
o seu luxo, a sua riqueza, não esquecia as noites de terror naquela mansão mal
assombrada pelo Imperador. A sua fúria, o seu desabafo se manifestava em forma
de ataques epiléticos e de histeria. Quantos tegretóis eram precisos para
segurar o tsunami de sua depressão; a onda mortal e opressora?
Dom Quixote quase
enlouqueceu com suas loucuras, mas conseguia superar com muito trabalho e
dedicação. Joana só trabalhou por 3 meses quando foi afastada do serviço por
estar grávida da primeira filha. A empresa alegou que ela usou de má fé, não
avisando da gravidez. Ela recorreu, e ganhou na Justiça em receber sem
trabalhar, por um ano.
A renda mensal do
casal mal dava para sobreviver. A cada 6 meses eram obrigados a mudar de casa
por conta do reajuste que triplicava o aluguel devido à inflação no ano de
1990. O salário não acompanhava. Quando Joana engravidou pela segunda vez, Dom
Quixote pediu aos céus para acertar na loteria. E, não é que conseguiu acertar
mesmo, mas ficou riscando cartão a noite toda. A aposta foi alta. Acertou na
antiga super-sena que é a atual dupla-sena. Ele só acertou os 5 números, faltou
1 para ganhar hum milhão. Ganhou apenas 10.000,00, onde pagou umas dívidas e
deu entrada num terreno em Santo Amaro – Jd. Santo Eduardo.
Dom Quixote
trabalhava no Frigorífico Bordon, era vendedor. Fazia o setor de Osasco, e
vivia só de comissões. Não existia mínimo de retirada ou ajuda de custo. Junto
com o prêmio da sena veio outra coisa boa, a empresa aumentou o seu setor de
atuação. Agora fazia de Osasco até Embú-Guaçu, abrangendo Taboão, Embú das
Artes, Campo Limpo, Interlagos, Grajaú e Itapecerica. As coisas foram
melhorando, e ele conseguiu construir sua casa. Depois, para melhorar mais
ainda, a Bordon comprou a Swift, e Dom Quixote ficou sem concorrência. Ele vendia
para o varejo, atacado, rede e mega-varejo. Em cinco anos conseguiu uma casa
com ponto comercial que fazia de garagem, dois carros, um semi-novo, um terreno
em Caieiras, e linha telefônica que naquela época poucos possuíam, no valor de
5.000,00. Suas comissões mensais giravam em torno de 10.000,00 (considerando
hoje). Ele teria um futuro brilhante e promissor depois de tantas tempestades
ruins e furacões, mas, infelizmente, existia a filha do diabo, do capeta do
Imperador.
Dom Quixote tentou
negociar com Joana D’Arc uma separação, não agüentava mais suas loucuras e
histerias. Ele buscou várias vezes achar uma cura através de psicólogos,
igrejas e macumba. Mas nada resolvia para curar aquele espírito perturbador.
Ela não melhorava da sua doideira e, procurava dificultar bastante a separação.
Queria muita pensão e até fazia ameaças de matar as crianças. Era para não
separar mesmo. Dom Quixote estava condenado.
Foram então para o
Sul. Lá talvez estivesse a solução para a cura. Dom Quixote pensou que, de
repente, num lugar mais calmo, perto de sua família, Joana poderia melhorar.
Mas nada disso adiantou, e o clima familiar só fez piorar. Vieram as cobranças
dos desafetos do Imperador. Os parentes de Joana começaram a lavar roupa suja.
E, com isso, os desentendimentos e as mágoas. Era como se tivesse num barril de
pólvora. Muitas acusações das patifarias do Imperador com a mãe e os tios de
Joana. Eles só agravaram mais ainda seu estado de espírito. Como se ela fosse
culpada de todos os crimes de seu pai.
Com essa tentativa
de achar uma solução, Dom Quixote só teve prejuízo. A separação era iminente.
Ele queria sumir, fugir daquele pesadelo. Era uma guerra psicológica maldita.
Ainda mais, quando ele descobriu a origem do problema. Joana revelou debaixo de
muitas lágrimas, com muito sacrifício, o que o crápula do seu pai tinha lhe
feito. Ela foi abusada sexualmente pelo canalha desde pequena. Dom Quixote
ficou perplexo, tanto pela revelação como também pela omissão deste crime pela
Joana durante os 7 longos anos de convivência.
Quando ele foi
participar a tia da Joana deste ocorrido, a infeliz desmentiu. Joana foi muito
cruel, desgraçada e mercenária. Como uma pessoa pode brincar com uma coisa
desta? Dom Quixote começou a analisar: quem ela estava protegendo? o pai; ou
ela mesma deste amor doentio? A partir daí ficou mais fácil para ele analisar
as coisas. Tudo se encaixava finalmente. Aquela conversa fiada do Imperador a
respeito do vendedor de disco ser pobre, depois o próprio Dom Quixote; era tudo
desculpas desfarrapadas. Ele queria mesmo era a filha para ser sua amante.
A separação só veio
depois de muitas brigas e desentendimentos. D. Quixote foi ameaçado várias
vezes por Joana. Ela fazia muita chantagem emocional. Ameaçava até de matar as
filhas. Ela teve a capacidade, para não dizer loucura, de jogar o carro contra
um muro com as meninas dentro, e depois deu ré pretendendo se jogar num
barranco. D. Quixote conseguiu com muito esforço alcançar o volante, e tirar a
chave do contato.
Para muitos que não
conheceram D. Quixote, ele não era um Merda, como o seu próprio pai o chamava:
pedaço de Merda. Dom Quixote não é um Merda, apesar de não ter dinheiro. Ele é
um homem trabalhador e honesto. A opinião injusta se forma com a nossa omissão,
com a nossa fraqueza, com a inconsciência criada pela manipulação do dinheiro,
pela convivência pacífica e tolerante com os imundos e crápulas nojentos de
todos os graus e tamanhos. Acusam e julgam descaradamente, forjando as próprias
sentenças. Muitos pedem para ele esquecer o passado, mas este é reflexo do
presente e do futuro. Como um aleijado vai esquecer aquele que o mutilou?
VEJAM
O TRANSCENDENTAL - http://escolasensitivista.blogspot.com.br/2010/04/parabola-do-transcendental.html