Mariúcha Fontana – Opinião
Socialista
Genocídio. É única palavra
que descreve o que está acontecendo com os guaranis Kaiowás. Segundo o Conselho
Missionário Indigenista (Cimi), nos últimos 12 anos, foram assassinados 390 kaiowás.
É uma média de 30 assassinatos por ano. Os relatos dos kaiowás sobre as
barbaridades cometidas pelos fazendeiros e pistoleiros são de arrepiar.
Os kaiowás sempre viveram
nas terras do sudoeste do Mato Grosso do Sul. Porém, desde que os colonizadores
chegaram à região, seu território foi roubado. Roubaram inclusive seus nomes. A
maioria dos sobrenomes dos kaiowás foi dado pelos donos de fazendas que
invadiram suas terras.
Além dos assassinatos,
outro fato que chama a atenção são os mais de 700 suicídios registrados entre
os kaiowás. Sem sua terra original, sem poder plantar seu roçado e manter seu
modo de vida, o suicídio se tornou uma via de fuga desesperada.
Em 2012, uma carta dos
kaiowás comoveu o país e teve ampla repercussão. A carta falava em “morte
coletiva” e foi interpretada como um anúncio de suicídio coletivo dos indígenas
frente a uma ordem de despejo da terra onde viviam.
“Quando os nossos se
suicidam, é porque não conseguem lidar com a humilhação e com a violência que
sofremos que tiram a nossa dignidade; dizem que mulheres se suicidam por brigas
com os maridos. É mentira. As mulheres se suicidam porque não suportam os
estupros dos pistoleiros, a violência física. Isso fica marcado na nossa alma.
Isso não é suicídio. É assassinato”, acusa Valdelice Veron (uma das
lideranças).
Envenenamento
Não é só com bala e pistola
que os fazendeiros tentam liquidar os kaiowás. É também com envenenamento da
água e da comida, com a pulverização de agrotóxico lançado por aviões sobre as
aldeias.
Na aldeia Takuara, a
matriarca Julia Veron mostra como o pequeno roçado de mandioca foi destruído
pelo agrotóxico. A matriarca mostra uma espiga de milho totalmente ressecada.
“Isso é por causa do veneno que eles jogam nas nossas plantações”, explica. O
veneno também é despejado sobre as aldeias e atinge velhos, mulheres e
crianças.
A matriarca e seu filho, o
cacique Ernesto Veron, nos levam até um pequeno riacho utilizado pelos
indígenas para beber água. De repente, nos deparamos com um imenso lixão à
beira do riacho. O lixo foi atirado por um fazendeiro e seus capangas
justamente para impedir que os indígenas possam consumir aquela água. Ernesto
diz que já denunciou o caso ao Ministério da Justiça, mas nada foi feito.
A fazenda pertence ao
fazendeiro Jacinto Honório Silva Neto, acusado de ser um dos mandantes do
assassinato do pai de Valdenice e Ernesto, o cacique Marco Veron, morto a
pauladas por jagunços em 13 de janeiro de 2013.
“Só vou parar de falar
quando o fazendeiro me matar, quando o pistoleiro acabar comigo. Mas eu vou
morrer tranqüilo porque eu to lutando. Eu não sou bandido. Sou apenas uma
liderança, um cacique rezador”, fala Ernesto, no meio do lixão, enquanto agita
nas mãos sua lança e um chocalho, evocando com sua reza os espíritos kaiowás. A
cena é de gelar a espinha.